Prefeitura mentiu ao acusar ex-procurador por denúncia ao MP

A prefeitura de Penha mentiu ao atribuir ao ex-procurador do município, Wagner Borges Figueiredo, a autoria de denúncia feita ao Ministério Público sobre possíveis irregularidades na compra de tubos em licitação do município. Wagner atua como advogado e participou do pregão 4/2017 representando uma empresa do segmento de construção civil de Balneário Piçarras, a Vibron.

A empresa não pode concorrer após ser declarada inabilitada. Conforme informações do site da prefeitura, Wagner recorreu em nome da empresa, mas teve novamente o pedido de participação da Vibron negado pela prefeitura, segundo parecer técnico do pregão.

No último dia 17 de maio, a promotora Andréia Soares Pinto Favero, da 1ª PJ de Balneário Piçarras, instaurou o inquérito civil público Nº 06.2017.00002965-3 para apurar suposto superfaturamento nos valores de diferentes tubos previstos no edital de licitação.

A denúncia chegou ao MP às 11h28min do dia 20 de março e, como é de praxe, começou como uma Notícia de Fato, ou seja, o Ministério Público precisava antes averiguar indícios mínimos de veracidade do relato para, como veio a ocorrer depois, instaurar uma investigação aprofundada.

Todos os dias eu busco informações em diários oficiais, jornais locais, sites públicos e outras fontes que rendem notícia. Foi em uma dessas buscas que, no dia 18, localizei o número do inquérito do MP sobre os tais tubos. É notícia e virou notícia no site (AQUI), de maneira imparcial, apenas indicando que o procedimento estava aberto. A prefeitura foi procurada e somente no dia seguinte enviou e-mail para a reportagem.

Foi aí que o nome do representante da Vibron, o advogado Wagner, surgiu na história. Reproduzo abaixo a resposta da prefeitura, tal como veio, incluindo as letras garrafais e os erros de digitação.

“Não houve superfaturmento. O representante da Vibron, o Wagner, que era PROCURADOR JURÍDICO DO EVANDRO, entrou com denúncia porque sua empresa foi desclassificada por não apresentar a documentação exigida. O ministério público vai apurá-la como apura todas as denúncias que lhe são apresentadas. Repudiamos o uso político que está sendo feito da denúncia, que foi plantada justamente para esses fins.”

Em seguida, enviei uma mensagem para o Wagner. Expliquei que a prefeitura o estava acusando de ser o autor da denúncia. O advogado afirmou que não tinha relação alguma com a investigação do MP. “A empresa que eu representava realizou medidas administrativas para rever a habilitação [na licitação], o que não foi acatada pela prefeitura. Nunca atuei de forma política, pois caso não concordasse com a decisão administrativa, poderia ter tomado as medidas judicias que achasse necessárias”, disse o representante da empreiteira.

No mesmo dia, à tarde, Wagner provou que não era o autor da denúncia. O caso chegou ao MP pelas mãos de um engenheiro industrial mecânico, identificado como D.O.C., com registro no Crea/SC. O nome dele não será divulgado aqui, já que, na denúncia, D.O.C. deixa claro à Promotoria de Justiça o porquê do sigilo: “…solicito sigilo nessa denúncia prezando pela integridade moral e física de toda minha família”, disse o denunciante pessoalmente ao Ministério Público de Piçarras no dia 20 de março.

Documento com rubrica da procuradoria-adjunta da prefeitura em 31 de março (Reprodução/Notícias de Penha)
E a denúncia? O que afirma?

O engenheiro que denunciou o caso afirma que os valores dos tubos previstos no edital do pregão da prefeitura estavam muito acima da tabela de custo disponibilizada pelo Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da Construção Civil (Sinapi), da Caixa Econômica Federal, usada como referência na elaboração de orçamentos.

No edital, por exemplo, o tubo de concreto armado PA 2 – 60cm está orçado em R$ 120,60. Pela tabela do Sinapi, o valor é de R$ 75,33. Foi o próprio Ministério Público que fez a comparação, juntada no inquérito o qual o Notícias de Penha teve acesso. O maior referencial é do tubo de concreto armado PA 2 – 100cm. No edital da prefeitura está por R$ 244,32 a unidade. Já na tabela juntada ao inquérito pelo MP, um tubo com as mesmas proporções sai por R$ 189,40.

Pelo menos desde o dia 31 de março a prefeitura de Penha tem conhecimento da investigação do MP. Pelo menos desde esse dia sabe que o ex-procurador não é o autor da denúncia. Em resposta enviada à reportagem, a prefeitura fala em “uso político que está sendo feito da denúncia, que foi plantada justamente para esses fins”.

Ao apontar o dedo para o lado errado, a prefeitura se valeu do mesmo expediente que diz repudiar.